domingo, 9 de maio de 2010

Prólogo - Página 6

– Imagino que queira ficar com o último objeto que ele carregava – disse enquanto colocava a mão na abertura e segurava a pedra.

– Objeto? – perguntou Elvira, tentando se esquivar de Irina. Mas seus olhos se arregalaram quando viu a pedra saindo da pasta de seu filho – Não... Não... era para você ficar com ela. Você o matou!

– Não. – Corrigiu Irina – Você o matou. Assim como matou o seu neto. Agora ela é sua. – disse com calma, virando as costas, mas num último momento, se virou – ah... eu não quero nada de vocês.

– Você não tem direito a nada, mulherzinha vulgar.

– Tenho – respondeu Irina – tenho o direito de saber que você nunca mais irá dormir em paz.

Irina virou as costas para Elvira e caminhou em direção a saída do cemitério. Esta, por sua vez, num ato de fúria atirou a pedra contra a lápide, quebrando-a em três triângulos.

Prólogo - Página 5

Eram cinco da manhã quando os gritos de Carlos a acordaram. A pedra estava no chão e os lençóis manchados de sangue. Seu filho havia morrido sem ter tido a chance de anuncia-lo para o mundo.

“Bruxa maldita” Irina murmurava sozinha “Você vai me pagar, vai, vai sim”, com os olhos injetados de sangue, enquanto colocava a pedra na pasta que Carlos levaria para São Paulo.
Quando ele chegou anunciando que finalmente conseguira um emprego, Irina entendeu de que forma a pedra traria a felicidade. O preço cobrado era a vida do seu filho. E algo lhe dizia que o preço da riqueza seria sua própria vida.
Carlos nunca chegou a São Paulo. O trem em que viajava descarrilhou, matando todos os que estavam em seu vagão. Irina foi pessoalmente buscar seus pertences. Fazia parte do seu grande final.

O enterro atraiu os mesmos poderosos que compareceram ao casamento. Só que nenhum deles prestou condolências a viúva. Passaram por ela como se fosse apenas uma funcionária do cemitério. Mas Irina sentiu prazer ao ver as lágrimas rolando no rosto de Elvira. Sabia que eram verdadeiras, pois ela vertera essas mesmas lágrimas quando a desgraçada matou o seu bebê.
O padre fez um belo discurso, as mulheres secavam delicadamente seus olhos secos por baixo dos véus negros. Com exceção de uma moça muito pálida, que sentada perto de uma árvore, olhava desolada para multidão que acompanhava o caixão baixar. Alguém a chamou de Clara, e o ódio que havia sido sufocado pelo fato de perceber, pela primeira vez, que não enviará para a morte apenas o filho de Elvira, mas o grande amor de sua vida, retornou com força. Carlos nunca seria dela, nunca foi. Nem nos poucos meses que conviveram junto.
Quando todos foram embora, Irina se aproximou da sogra e vagarosamente abriu a pasta de Carlos: