domingo, 12 de julho de 2015

Um dia de domingo

A estrada era de chão batido. De terra vermelha. Os três meninos corriam, seus cabelos loiros se confundiam com a soja plantada.
- Tio Henrique! Tio Henrique! A nona chegou.

Henrique desligou a colheitadeira, com um sorriso nos lábios, colocou o mais novo na garupa.
- Mais rápido! Mais rápido! - Gritava Guilherme chegando às escadas da casa azul.

Tiraram os tênis e calçaram os seus chinelos. A mãe sempre dizia que eles podiam ser colonos, mas não eram porcos para encher de poeira a casa que mantinha limpa.

Vozes altas vinham da cozinha, o cheiro quase os vazia flutuar. O pai abria a garrafa de vinho, enquanto a tia Clodete passava um pano nas taças.

O bebê de Marina, a prima mais velha, dormia próximo a janela, cuja cortina dançava lentamente conforme a música do vento. A respiração calma do pequeno anjo de cabelos encaracolados, não impediam um súbito desejo de dar beijos estalados em suas bochechas.

Mas a prioridade era Nona Odete. E os meninos logo a cercaram, sentindo o seu cheiro de alfazema, tocando em seus cabelos de algodão, recebendo um abraço que os faziam sentir protetores e protegidos. 

A matriarca da família estava completando noventa anos. Seus olhos verdes brilhavam de forma especial, do tipo que só quem aproveita a vida possuí. Isso se refletia na parede onde ficava a grande mesa de madeira. Nela estavam as fotos de todos os casamentos, nascimentos, formaturas e viagens da família.

Quando o pequeno Guto nasceu, Cecília, a filha mais nova de Dona Odete, quase enlouquecera buscando um espaço.
- Meu velho, vamos ter que tirar a tua coleção de garrafas.
- Não.
- Sim.
- Vou transferir para a área da churrasqueira.

Apesar de ainda ser a dona da casa, a nona preferia viajar um pouco com cada um dos filhos e netos que havia se aventurado fora da fazenda. Apenas Cecília ficara com a sua família.

- Voar? Não sou passarinho. Deixa os meus pés bem aqui. Já me basta a agonia de saber que logo o meu Henrique será engolido por este mundo de Dio.

Agora Odete estava retornando de Paris. Seu marido havia prometido retornar nas bodas mais importantes. Neste ano completariam 75 anos juntos. Pela primeira vez, foi sem ele. Ninguém sabia, mas havia guardado um pouco de suas cinzas para jogar no Rio Siena. Agora ele estaria lá, sempre a esperando.

Havia apenas uma regra na família, todos deveriam sempre retornar a casa azul nas manhãs de domingo. Era quando a grande mesa enchia com os 4 filhos, 9 netos e 5 bisnetos.

- Dr. Pedroca chegou. - A voz estridente de Gabriela ecoou, fazendo o bebê abrir os seus olhos, espiar a loucura e voltar a dormir.

Pedro ajudou a esposa a pegar as filhas gêmeas. Sorriu ao ver a pintura renovada da sua casa de infância. Já andara pelos quatro cantos do mundo, mas era o único lugar ao qual chamaria de lar.

Sentaram-se todos a mesa, falavam ao mesmo tempo, brincavam, contavam histórias. Pão quentinho era colocado à mesa, junto com o grande prato de massa, seguido pelo de carne.

- Não esquece o queijo. 
- Eu quero a salada de batata da tia.
- Vocês esqueceram que eu estou de dieta?
- Mãe! Me serve.

Suco de uva para as crianças. Vinho para os adultos. Os pratos em segundos tinham os seus desenhos escondidos. 

- Uma taça fara bem para você e para o bebê - impusera tia Antônia.

O brinde, uma oração e todos se servindo.

Era mais um domingo. Era mais um ano. Era sempre uma celebração.

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