segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Capítulo Quinze

Curitiba, Ópera de Arame

– Meu Deus – murmurou Clarissa de ponta cabeça, sentia os pés enrolados na grade, mas não sabia quanto tempo iria agüentar. Não tinha coragem de gritar.
– Clarissa! O que aconteceu? Agüente firme. – Jorge falou – Marcelo! Me ajude.
– O que é isso? Como ela foi para ai?
– Não sei. Segure as pernas dela. vou pedir para ela dar um impulso e ver se eu alcanço as suas mãos.
– Ok.
– Clarissa! O Marcelo está segurando as suas pernas. Dê um impulso com o corpo e estenda os braços. Tente pegar na minha mão.

Clarissa sentia as mãos de Marcelo em sua panturrilha. Ele era magro e isso lhe dava medo, pois achava que ele não agüentaria o seu peso. Por outro lado, não podia se arriscar a cair. Deu o primeiro impulso e não chegou nem perto das mãos de Jorge. Sentiu uma dor nas costas ao bater com elas na grade.

– Não desista, Clarissa. Tente novamente. – Jorge gritou.

Respirando fundo, Clarissa deu um novo impulso e dessa vez seus dedos chegaram a passar pela mão de Jorge. Um novo choque com a grade e Clarissa não segurou nem o grito nem a retenção do corpo. Seus pés começaram a se soltar e Marcelo se apavorou.

– O que vocês estão fazendo? Meu Deus, ela tentou se matar? – disse uma voz ao mesmo tempo em que Clarissa sentia mais duas mãos em seu corpo.
– Não. Ela caiu. Mas não me pergunte como. – Clarissa ouviu Jorge respondendo. – Clarissa. Temos mais gente aqui. Tente mais uma vez.

Clarissa deu um novo impulso e dessa vez, suas mãos agarraram as de Jorge. Sentiu seu corpo ser puxado. Quando colocou os pés no chão, observou uma multidão em sua volta, entre eles o rapaz que a empurrou.

– Foi ele – ela apontou – foi ele que me empurrou.
– Eu?! – exclamou o rapaz. – Essa mulher é louca!
– Foi um acidente. – Disse uma voz mais ao fundo. – Ele se desequilibrou e encostou nela, que estava descuidadamente sentada em um lugar perigoso, carregando um peso que não era seu. – conforme a voz foi se aproximando, Clarissa o identificou como o homem cabeludo.
– Obrigado Samuel. – disse o guarda ao qual Clarissa reconheceu pela voz, como o homem que havia lhe ajudado – Vocês dois foram errados. Rafael – disse apontando para o rapaz – você e seus amigos sabem que não é para correr aqui. E você mocinha – disse apontando pra ela – por usar indevidamente a grade como banco. – suspirou – Como estão todos bem, vamos todos circulando.
– Vamos, Clarissa. Ainda temos trabalho a fazer.

Clarissa acompanhou o colega, dentro da ópera lembrou da pedra de Lúcia. Quando despencou, sua mão abriu e ela chegou a ver a pedra caindo dentro da água. Agora, teria que se explicar.


– Então? – Soraya perguntou ansiosa – Que tal o seu primeiro dia de trabalho?
– Um sonho. Nem acredito estar trabalhando num lugar como esse.
– Eu também me senti assim. Tinha medo de estar sonhando, acordar e dar de cara com aqueles malas.
– Engraçado, tive a mesma sensação. – Lúcia sorriu – Sabe, achei que ia sentir falta do Júnior, mas desde o dia que ele conseguiu a minha demissão...
– Você finalmente se deu conta que ele não era um príncipe encantado?
– Nem sapo encantado.

Ambas gargalharam. Ouviram o sinal. Era hora de ir embora. Pegaram as bolsas e Lúcia olhou mais uma vez para a sua mesa. “Minha mesa” pensou “preciso trazer algumas coisas para colocar nela, dar o meu toque pessoal.”

– Cadê a Clarissa? – Lúcia perguntou a Soraya quando entraram no ônibus.
– Não sei. Samuel cadê a Clarissa?
– O Jorge ia largar ela em casa. Ele está com o carro da empresa.
– Obrigada.
– Achei que seria rápido lá. – comentou Lúcia.
– São muitos detalhes. E provavelmente eles iriam passar na empresa contratada para conversar.
– Achei que eles realizavam as reuniões dentro da Ambiente.
– Por via de regra sim. – Soraya começou a explicar – mas a empresa de decoração fica próxima a Ópera de Arame, não havia sentindo virem pra cá.


Quando Clarissa chegou em casa, o ônibus dos funcionários já estava retornando. Suas costas doíam muito, e o remédio receitado pelo médico ainda não fizera efeito. Soltou o cinto devagar. Jorge a olhava preocupado.

– Você está bem?
– Bem, bem eu não estou. Mas vou sobreviver.
– Se você precisar de qualquer coisa, pode contar comigo.
– Obrigado Jorge. Você já foi muito gentil me levando médico. Pode ir descansado, não quero que briguem contigo por chegar atrasado em casa.
– A única pessoa que poderia brigar é a minha mãe – Jorge disse enquanto pegava as mãos de Clarissa – mas ela ia ficar feliz de conhecer você.

Clarissa não sabia o que dizer. Muito vermelha, murmurou uma despedida e saiu do carro. As dores nas costas milagrosamente sumiram. E seus pés pareciam estar caminhando sobre as nuvens. Entrou no elevador com olhos sonhadores e somente quando colocou a chave na porta, lembrou da pedra de Lúcia.

Nesse momento, todas as luzes se apagaram e suas mãos tremeram. Sentiu algo passando rente ao seu corpo. Em desespero, girou a chave, quando deu a segunda volta as luzes voltaram. Abriu a porta e encontrou suas duas colegas terminando de arrumar a mesa.

– Chegou bem na hora hein?! Brincou Lúcia.
– O que houve, Clarissa? – Soraya perguntou.
– Nada.
– Você está com uma cara estranha. – Soraya a olhava com o semblante sério.
– Estou cansada. Só isso.
– Como é a Ópera? – Lúcia perguntou, tentando distrair as duas.
– Bonita. Muito bonita. – Sentou-se com cuidado, colocando a cabeça para trás e fechando os olhos. – Vamos ir lá qualquer dia. Mas todas de tênis.
– Você está machucada? – Soraya sentou-se também.
– Eu... eu cai lá.
– Tadinha. – Lúcia serviu chá para todas.
– O que aconteceu? – Soraya questionou, querendo detalhes.
– Meu salto prendeu na grade da ponte e eu cai – mentiu – mas me esqueçam um pouco e contem: como foi o primeiro dia de Lúcia?

Animadas, as duas começaram a contar sobre o passeio que deram na empresa, as pessoas que Lúcia conheceu e as suas primeiras impressões.

– Heloísa é fantástica. – comentou Lúcia, com um sorriso de orelha a orelha.
– Você diz isso porque não conheceu o chefe da Clarissa. – Soraya suspirou. – Jorge é tão lindo.
– Hum... romance no ar?
– Não pra mim. – Soraya riu – Ele é toda da Clarissa. Tanto que eles se tratam como colegas e não como chefe e subordinada.
– Pare de falar besteira. – Clarissa ficou constrangida. – O Jorge é apenas um rapaz querido. É que vocês estão acostumadas com os Júniors da vida.
– Me diz – arqueando as sobrancelhas, Soraya a encarou – se ele se aproximasse de ti, tu não irias derreter?

Por um momento, Clarissa sentiu novamente as mãos quentes de Jorge segurando as suas.
– Eu vou é tirar a mesa. – Levantou com o rosto vermelho.

Lúcia e Soraya caíram na gargalhada. Enquanto Clarissa levava os frios para a cozinha. Não iria contar nada para elas agora, ainda não era o momento. Não sabia se Jorge falava sério, e não queria virar amante de ninguém. Ainda duvidava que um homem como ele não tivesse nenhum tipo de relacionamento.

– Eu vou para o meu quarto, separar umas coisinhas para colocar na minha mesa particular. – Clarissa ouviu Lúcia comentar alegremente.
– Gostou, né? – Soraya brincou.
– Amei. E uma das coisas que irei levar é a pedra que vocês me deram.

Clarissa fechou a porta da geladeira, sentindo-se tão gelada quando os alimentos que ali estavam. Sem pensar, foi para a sala, mas Lúcia não estava mais lá. Caminhando até o quarto, não sabia como se explicar, mas não tinha tempo pra isso. Quem mandou pegar algo que não lhe pertencia.
Torcendo as mãos, parou no meio de corredor que dava acesso aos quartos. Não sabia o que dizer e resolveu que o melhor era simplesmente falar a verdade.

– Lúcia. – chamou dando uma leve batida na porta.
– Diga. – Lúcia se virou para ela, e em sua mão direita estava a pedra triangular.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Olá! É bom ter você por aqui. Em breve o seu comentário será postado. Dúvidas e sugestões são sempre bem recebidos.