segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Duas notas

É como uma música chata, que não sai da cabeça e faz os pés balançarem. A necessidade de espaço que torna o ar que se respira muito mais pesado. Os óculos na ponta do nariz, como se ele mesmo fosse um empecilho para a visão. Abrir janelas e portas com gestos automáticos, como se a alma pudesse utilizá-los como rota de fuga. Mas a cabeça balança, indicando que tudo não passa de uma mentira. Dolorosa e artificial.

Queria gritar, mas lhe é proibido. Queria correr, mas os pés estão acorrentados. Imagina um laço que ira se prender no primeiro avião, mas algo prende as suas mãos. O tempo se torna herói e vilão, nada mais importa, é apenas uma mentira. Profunda e rasa.

Não dorme mais a noite, pois se esqueceu de sonhar. Os teclados procuram furiosamente com quem conversar. A cerveja está quente, pois ela não é mais necessária para fingir amar. A pupila dilata com as imagens recebidas, escuta carros passando no bairro vizinho, quando o ouvido tenta identificar os sussurros descritos. O relógio toca lembrando que tudo não passa de uma mentira. Real e virtual.

O pedal do acelerador o transforma em um deus. Motor com motor, freada repentina, seca o suor da testa. Não existe mais espaço para se mostrar. Famílias desenhadas ao redor debocham da sua solidão. Sente gosto de sangue na boca ao mesmo tempo em que escuta as buzinas. O sinal verde lembra que ele é a única verdade, o resto não passa de uma mentira. Rápida e tardia.

Por isso quando sentiu o impacto na ponte fazendo o seu carro flutuar, seus orifícios tomados pelas águas escuras de um rio qualquer, pensou ser uma benção para logo em seguida ser tomado pela raiva e num último gesto bater o punho contra o volante. Pois se era bom, era uma mentira. Morte e vida.

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